Descobri Sylvia Plath em um seriado espanhol sobre um crime que assola uma pequena cidade ou vilarejo e sobretudo seus alunos adolescentes, após a professora de literatura, que vivia uma relação complexa e paradoxal com alguns deles, é dada como morta por suicídio e estava justamente estudando essa autora.

Não me lembro do nome do seriado, mas se eu achar prometo colocar nos comentários.

Comprei o ebook que me pareceu ser o mais emblemático dessa norte-americana, que se suicidou aos 30 anos de idade. Mas, na verdade, o que me interessou mesmo foi seu diário – não sou a única a ter um -, mas só existe na versão física e então não comprei. Já me conheço: em poucos dias estarei com ele. Conhecer a biografia do autor é quase como investigar um crime ou fazer uma sessão de psicanálise por telepatia.

Parte da história se passa em Nova York e já me ganhou só por isso. O que não significa que estou indiferente à pandemia – apenas aos leitores chatos que não entenderam que sentir saudade dos pequenos privilégios que nós foram subtraídos não denota ausência de medo, tristeza nem compaixão com nosso triste momento, menos ainda esbanjamento de bons momentos – só sobrou o passado pra contar e se você não curte não precisa ler minhas crônicas.

Depois de uma vida que mudou tanto, a identificação foi quase imediata com o trecho em que ela fala das roupas “caras e desconfortáveis, penduradas no armário feito peixes na feira”, e que não significavam nada do lado de fora do mármore liso e dos vidros das fachadas da Faria Lima. Digo, da Madison Avenue. Mas poderia ainda ser a Berrini, a Avenida Paulista… Meus vestidos de princesa também estão pendurados feito peixe na feira e em breve começarão a feder. Creio que o nome disso é revolução. A roupa é também nossa casa, onde escondemos nossas imperfeições e tentamos ser um pouco do que a sociedade individualista em que vivemos nos impõe – ou impunha antes da pandemia?

A autora também cria empatia comigo no trecho em que destaca que “só pulava”. Do hotel para as festas, das festas para o hotel e do hotel para o trabalho. O que Sylvia chama que pulos eu denomino “fuga”. Uma fuga estabanada, sem rumo, mas tão necessária quando respirar. E fugir em plena pandemia não foi possível. Enfrentar a dureza de mais de ano solitário e sem otimismo pode não conduzir a uma clínica psiquiátrica como foi o caso da protagonista, mas deixa a gente louca, deixa sim.

Sylvia fala do vazio, da solidão, do silêncio interior, de estar esgotada e enrugada. Eu falo do vazio, da solidão, do silêncio interior, de estar esgotada… só escapei do “enrugada”, mas posso apostar que que é culpa dos óculos.

Não darei spoiler do livro. Leiam. Sua linguagem é simples, porém cheia de camadas. Os insensíveis ficarão com uma resenha de uma doida que vai para uma clínica psiquiátrica. Os atentos talvez parem para refletir o tanto que não é necessário cagar palavras rebuscadas para tocar o mais íntimo do ser humano.

É meio pretensioso da minha parte, mas eu gostaria de tê-la conhecido. Talvez pudéssemos ser amigas. Como ela já faleceu, fiquei amiga dela por meio de seu livro.

Talvez a melhor frase da obra que, na minha opinião, além de atemporal, se encaixa aos tempos atuais seja: “Tive a impressão de que não era noite nem dia, mas um hiato sombrio que tinha repentinamente se enfiado entre os dois e agora nunca mais iria chegar ao fim”.

Um salve à Sylvia!

Para quem estiver interessado, seu livro está à venda na Amazon. Os meus também – “Confissões de uma Jovem Viúva”, “Devaneios de uma Pandemia” e “Bode Jurídico”.

Ivy Cassa é escritora, criadora do Blog Portas Abertas (portasabertas.blog), apresentadora do programa Duas Taças com a Ivy, estudante de psicanálise e de antropologia. Ah! E paga suas contas e banca seus hobbies sendo advogada. Muitas vezes se sente, tal como Sylvia, em uma redoma de vidro, sendo lentamente cozida em seu próprio ar viciado.

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