Nunca mais usei um par de meias. Às vezes, cada uma vai parar num cesto diferente. Parear meia é preciosismo; coisa de virginiano.

Mudaram a coleta de lixo do meu prédio. Antes era no andar, agora é no térreo. Perdi o pudor de pegar elevador de pijama desde o dia que o lixo ainda era no andar e encontrei, depois de 5 anos morando aqui, um vizinho. E eu estava de short e sutiã.

Tenho ímpetos de abraçar e beijar o Rappi cada vez que ele consegue algo que está em falta. Outro dia, um foi a outro mercado e comprou a minha canjica com dinheiro do seu próprio bolso. Chorei. Se alguém conseguir o papel higiênico pode ser que eu quebre o protocolo definitivamente.

Me apeguei a café (???), bolinhos de bacalhau congelados, pacotes de alface higienizados, nuggets de ervilha congelados e veganos, pêssegos em calda e potes de nutella. Não, eu não tou grávida, porque a quarentena tem efeito contraceptivo. Eu como estranho mesmo e a quarentena só acentuou essa esquisitice.

A vizinha de cima definitivamente não me deixa dormir. Já teve noite que liguei. Que xinguei. Que mandei carta. Que bati no teto. Que chamei o zelador e o síndico. Além de raiva por ela atrapalhar meu sono, passei a ter pena dela. Uma senhora sã não anda de salto alto de madrugada pela casa. Nem nega tudo isso no dia seguinte. Menos ainda joga a culpa na vizinha de cima do apê dela.

Parece que só eu e meia dúzia ficamos na 💩, com pouco trabalho e muito calote. A maioria ou é mentirosa ou já foi para outro estágio de desenvolvimento espiritual que não alcancei. Tem uma meia dúzia que não importa o dia ou hora que eu ligar, sempre vai dizer: estou trabalhando muito. Ou pegou mania do “não posso, tenho reunião. Até 2025.” Se passar pelo LinkedIn? Tão explorando mais em cima de coronavírus do que chocolateria em época de Páscoa. Nesta semana eu já tava quase entrando numa live – a de n. 56 do dia – sobre o covid no Paquistão. 😱😱😱 um bando de “pseudoummontedecoisas E coach” assistindo qualquer porcaria, reluzentes em seus cabelos engomados e ternos pijama, e eu sem lavar o cabelo, preso pra cair menos, pensando em qual boleto privilegiar.

Não nasci pra administrar uma casa. Passei 5 anos depois que Pedro foi embora fingindo ser a CEO do Reino dos meus Devaneios. A Rainha está louca. A Rainha sempre foi louca. Não zerei uma única pia, preciso comprar pelo menos mais 3 cestos de roupa suja só pra fazer estoque. Os 2 atuais não dão conta. Porque lavar envolve estender, e por mais que eu não passe, tem de guardar e… Considerei passar a usar roupas descartáveis. Mudei de ideia. Achei antiecológico. Pode ser que eu repense o assunto. Não sou capaz de encontrar um lugarzinho na casa onde não haja um ninho de cabelos meus. Mesmo tomando pantogar todo dia e ficando o dia inteiro com os cabelos presos. Já estou tomando banho no banheiro de visita porque minha suíte não tem mais condições. Criei um único metro quadrado pra fazer vídeos / reuniões / programas de receitas, que é o único lugar do apartamento que não parece que foi revirado por uma gangue de bandidos.

A vizinha de cima da vizinha de cima talvez seja ainda pior que a só de cima. A de cima diz que quem galopa é a de cima dela, e a de cima dela pediu meu WhatsApp pra mandar a foto do seu “chinelinho”. Depois, disse que eu não durmo porque não rezo o terço e bateu o interfone na minha cara. Tive ódio e pena dela. Tão religiosa e faltou bem na aula de compaixão com o sono alheio. Ela que pegue seu chinelinho e… Ivy, se segura!

Não suporto mais receber telefonemas da América Financeira. Faz 5 meses que meu dia de sorte é quando eles só me ligaram 3 vezes ao dia, ao invés das 4 habituais. Por conta da pandemia, como estou (só eu e aquela meia dúzia que mencionei) com mais tempo ocioso, tive o preciosismo de registrar cada chamada no tal do “Não Perturbe” do Procon. Não é todo dia que tenho essa paciência, mas mesmo assim já foram mais de 2 dezenas de reclamações. Não mudou nada. Tenho raiva da América Financeira. Tenho pena dos atendentes, que não merecem trabalhar num lugar assim. Passei a deixar meu telefone quase 90% do tempo desligado por causa disso. Lamento pela minha mãe e pelos amigos que precisarem falar comigo com urgência. Se precisarem, têm de mandar uma mnsg antes pra eu saber que não são os… Obrigada, América Financeira! Vocês roubaram minha liberdade, acabam com o meu humor e a gente sequer foi apresentado.

Tenho raiva daqueles que nem me conheciam, eram empresas aparentemente de respeito e até hoje não me pagaram nem sinalizaram que iam fazê-lo depois de pedir um “favorzão” de uma hora pra outra. Acho que vou dar o telefone pessoal de cada um para a América financeira. Me aguardem!

Tenho choros estranhos. Fora o de saudade da mãe, que é compreensível, eu já chorei porque manchei um estoque de roupas com menstruação –
como se fosse a menarca -, chorei quando queimou uma das 4 luzes da cozinha porque não sei nem como começa q desmontar o lustre quanto mais escolher a lâmpada. Chorei quando 2 das 3 lâmpadas do banheiro queimaram. Chorei quando derramei azeite em cima do sofá. Chorei quando um dos cabos do iPhone deixou de funcionar. Chorei quando o Rappi disse que não tinha mais papel higiênico, nem alface lavada, nem pêssego em calda, nem milka, nem miojo de legumes. Chorei porque achei meus choros tão bobos porque deve ter gente que nem o arroz com feijão tem e eu aqui chorando!

Chorei no dia que precisei ir a uma consulta e a mulher que estava na minha frente se recusou a entrar no elevador comigo. Talvez eu também passe a fazer isso. Mas achei muito triste.

Choro porque acho que a maioria das pessoas ainda não se deu conta do que está acontecendo e que nem que a gente tivesse todo dinheiro do mundo pra ir pra um lugar muito especial estaria a salvo.

Choro todos os dias porque aos 38 anos não encontrei alguém que chorasse ou sentisse saudade de ou por mim (não que eu fosse lhe fazer sofrer!), com exceção da minha mãe, por quem tanto choro. Tenho a sensação de uma vida que definitivamente não foi.

Choro porque quando pela primeira vez na vida resolvi me dar de “presente” um sabático, depois de ser bem açoitada por umas duas dúzias de gente, alguém mais forte que eu emendou meu nem tão glorioso sabático numa penosa quarentena.

Não sou chorona, gente! Estou só compensando 38 anos de um choro que tava aqui dentro. Como diria tia Regina, choro porque tenho uma “dor fininha”.

Choro porque daqui a alguns dias minha mãe faz aniversário e eu queria fazer uma celebração tão bonita quanto a do ano passado – que choro assistindo. Mas choro porque nem sei se a gente vai poder se ver nesse dia.

Choro, escrevo, vocês leem, eu até choro menos. Menos ainda quando vocês mandam mensagens solidárias e espalham ❤️. Faço receitas toscas, eu sei, mas é pra vocês também chorarem menos.

Bom fim de semana, leitores! Se eu estiver menos chorona vou tentar apresentar uma surpresa pra vcs.

🤷🏼‍♀️😢❤️
Ivy Cassa