Depois de um banho quentinho, que dizem relaxar a musculatura, deito na cama às 22h.

Outro dia li que os CEOs das empresas acordam às 5h. Li também que, com o passar dos anos, vamos dormindo menos. Com isso e pela minha idade, minha matemática conclui que 7h de sono serão suficientes para me conduzir ao almejado cargo.

Um comprimido de melatonina, um chá de lavanda, pijama limpinho e lá vou eu. Vem, Morfeu! Me possui que hoje sou toda sua!

Deito ao lado direito da cama, acendo o abajur e começo a ler “Memórias do Subsolo”, de Dostoiévski, um livro denso, que certamente vai me cansar – ainda mais a essa hora da noite. Aposto que antes das 22h30 já estarei dormindo.

Às 22h25, estou de fato cansada da leitura. Percebo que preciso ler algo mais leve porque aí sim o sono virá.

Reviro a pilha dos livros ao lado da cama e encontro “Homem Objeto”, da Tati Bernardi. Às 23h15, totalmente entusiasmada pelas crônicas divertidas da autora, reconheço que é necessário baixar o ritmo.

Que vou ler agora? Já sei: um texto sobre seguros em inglês que baixei da internet outro dia. Deito do lado esquerdo da cama. 23h30: o texto é mesmo chato, mas ainda não tenho sono.

A culpa deve ser do abajur, porque essa luz não me deixa produzir melatonina! Entro no Google e digito: “abajur com regulador de intensidade de luz”. Após uma cuidadosa pesquisa, descubro que há um modelo formidável de abajur que vende nos Estados Unidos, em que é possível programar o horário de ir para a cama e o de dormir, e ele vai gradualmente diminuindo a luz até apagar. E não é só isso: o despertar também é assim, mas com a vantagem de ter um acoplador de iPhone e ser possível colocar sua música preferida para tocar ao amanhecer. Taí! É isso que me falta pra dormir. O único problema é que à 0h22 fico sabendo que eles não fazem entregas para o Brasil.

Bem… se Maomé não vai à montanha… Entro nos sites das companhias aéreas e passo a buscar promoções de passagens. Quase que dá pra eu tirar uma passagem com milhas pra Nova York, falta só um tantinho… à 1h05 entro no site do banco, descubro que tenho as milhas que faltam, à 1h20 todos os pontos estão na conta do cartão fidelidade e às 2h03 já tenho passagem, o hotel está reservado e o abajur comprado – com entrega programada para a minha chegada. Às 2h20 já tenho até um ingresso para assistir Frozen na Broadway! Só não tenho sono.

Apago a luz do abajur que causou toda essa confusão, deito na diagonal da cama e ligo o iPad. Vou ler algum e-book. Escolho Rubem Braga. Puxa!! Taí alguém que sabia escrever crônicas. Às 2h54 resolvo entrar no YouTube pra ver se tem algum vídeo sobre ele. Encontro um documentário de quase meia hora de duração: certamente vou acabar dormindo enquanto assisto – sou bem dessas.

Às 3h24 o filme acaba e entra uma chamada de pizza na madrugada pelo IFood. Constato que estou com fome. Vou até a cozinha em busca de Nutella, mas lembro que me desfiz de todos os doces depois da última consulta com o nutricionista. A única coisa mais ou menos doce que tenho em casa são beterrabas, mas recordo-me que passei mal da última vez que as comi. Olho para os ovos – proteína dizem que é bom antes de ir pra cama. Às 3h40 estou comendo uma omelete de beterrabas.

Às 4h02 estou vomitando a omelete de beterrabas e às 4h05 tomando um Dramin. Dramin é tiro e queda. Agora vai!

Deito com a cabeça nos pés da cama e, pra dar uma ajudinha, coloco um vídeo no YouTube sobre meditação com barulhos da natureza. Que delícia! Relaxo os músculos da cabeça, as mandíbulas, as articulações, o estômago já vazio, os dedinhos dos pés e finalmente pego no sono.

Até que, às 4h40, acordo de supetão assustada: tá chovendo na minha cama!!! Tento acender a luz do abajur apressada, o abajur cai, pego o celular e ligo a lanterna… o som vinha debaixo do edredom: era o vídeo da meditação que terminava com uma tempestade totalmente desnecessária.

Perco aquele pouco sono. Só eu e os sabiás tentando acasalar estamos acordados, com a importante diferença que eu nem acasalando estou.

Às 5h, tomo três decisões: (i) vou tomar um remédio sossega leão; (ii) vou escrever uma crônica sobre a insônia e (iii) não quero mais ser uma CEO.

(Ivy Cassa)

#portasabertas #portasabertasivycassa #aquelafaltaqueelemefaz #insonia #autoficcao #autoficção #literatura #leiamulheres